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Texto de Arnaldo Branco

Todo mundo na época (1981) acompanhou o casamento do Príncipe Charles com Diana Spencer e lembra que a transmissão durou quase um dia inteiro. Foi provavelmente a tomada mais lenta de uma carruagem percorrendo um trajeto curto desde os filmes de época da nouvelle vague. Mas o que poucos sabem foi o trabalho que deu às equipes de TV da época para evitar mostrar uma série de acontecimentos bizarros, portanto típicos de um casamento.
O atraso de praxe da noiva, por exemplo, aconteceu porque até a última hora os advogados de Diana negociavam cláusulas do acordo pré-nupcial, que estabelecia limites para o uso de fixador no cabelo de Charles e proibia terminantemente que o herdeiro do trono levasse para a banheira sua coleção de barquinhos em homenagem à Frota Real Inglesa. Mas apesar das câmeras terem flagrado a princesa assinando os últimos papéis já na escadaria de sua casa, indo em direção ao coche, uma ordem disparada pelo Palácio de Buckingham fez com que os telejornais descrevessem aqueles homens de terno e pastas 007 como “caçadores de autógrafo”.

Na hora da tradicional e simbólica pergunta do padre “se alguém tiver algo contra essa união, que fale agora ou se cale para sempre”, foi necessário desligar a câmera 23, que captou Camila Parker Bowles, a namorada horrorosa preterida por Charles (por pressão da família e não por bom senso, infelizmente) se levantando para mostrar uma carta em que o Príncipe, naquela época ainda tímido em suas declarações para a baranga, dizia “quero ser o seu descongestionante nasal”.
Mas as emissoras de TV mostraram com ênfase sua retirada da catedral de St. Paul, depois de, fora do alcance das câmeras, ter recebido um golpe de clava de um agente da Scotland Yard. Todos os comentaristas de casamento (na Inglaterra um cargo de importância, graças aos tablóides) falaram sobre o desmaio de uma fã emocionada do casal - mas o enviado especial da Rede Globo, Clóvis Bornay, por dentro dos babados, soltou um “cala-te boca” no ar seguido de risinhos abafados.

Durante os cumprimentos, um cavalariço que tinha conseguido se passar por Conde (na era Tatcher os títulos de nobreza tinham barateado e era difícil distinguir uma falsificação) beijou demoradamente a Princesa na boca. Não foi possível evitar a filmagem da cena, mas Charles pensou rápido e também beijou o cavalariço, inclusive inclinando o sujeito à maneira dos apaixonados. O narrador oficial da cerimônia disse que se tratava de um costume do condado e todo mundo caiu nessa. Mais tarde esse trecho da gravação foi confiscado a pedido da Família Real.

Ninguém sabe, mas pelos bons serviços prestados, o diretor de jornalismo da BBC que coordenou a cobertura do evento foi condecorado pela Rainha com a Ordem Secreta do Sigilo Colaboracionista, a honra máxima que pode aspirar um profissional chapa-branca da imprensa.

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